Invisibilização do trabalho de cuidados exercido por mulheres impacta ODS 5

Os quase três milhões de estudantes que prestaram o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) foram convidados a pensar sobre uma das principais razões de exclusão de gênero no Brasil: o trabalho de cuidados invisível e não remunerado realizado pelas mulheres. Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), divulgados em agosto pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostraram que, em 2022, as mulheres dedicaram 9,6 horas por semana a mais do que os homens aos afazeres domésticos ou ao cuidado de pessoas. Trabalhos que não foram remunerados e são invisibilizados pela sobrevivência no sistema capitalista da divisão do trabalho das sociedades tradicionais que reservava às mulheres as tarefas domésticas, apesar de hoje elas dividirem o mercado de trabalho com os homens. Essas atividades, apesar de invisibilizadas, contribuem para o Produto Interno Bruto, segundo pesquisa do FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas), com pelo menos 8,5% de toda a riqueza produzida no país, ou seja R$ 765 bilhões dos R$ 9,9 trilhões do PIB de 2022.

A divisão das tarefas domésticas permanece desigual mesmo quando a mulher está no mercado de trabalho: em média, as mulheres ocupadas dedicaram 6,8 horas a mais do que os homens ocupados aos afazeres domésticos ou ao cuidado de pessoas em 2022. Esse quadro, em que a mulher além de sobrecarregada não tem seu trabalho valorizado, impacta negativamente os indicadores do quinto Objetivo de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030, que pretende promover a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas. Objetivo que, segundo a Organização das Nações Unidas, só será alcançado, se mantido o ritmo atual das políticas públicas, em 300 anos. O Brasil é o 92° de 153 países no ranking de garantia de equidade para mulheres, segundo o Relatório Luz, elaborado por entidades da sociedade civil, tendo retrocedido em 2022 por causa dos efeitos da pandemia da Covid-19 e das históricas e múltiplas violências de gênero derivadas da insuficiência de políticas públicas e de investimento do Governo Bolsonaro.

A meta 5.4 do quinto ODS trata especificamente da necessidade de se “reconhecer e valorizar o trabalho de assistência e doméstico não remunerado por meio da disponibilização de serviços públicos, infraestrutura e políticas de proteção social, bem como a promoção da responsabilidade compartilhada dentro do lar e da família, conforme os contextos nacionais”. A importância desse tema na vida das mulheres é central, já que cuidar da casa ou de alguém pode impactar os planos pessoais e profissionais de mulheres e mesmo de meninas. A omissão do Estado em assistir aos grupos mais vulneráveis, incluindo crianças, portadores de deficiências e idosos, contribui para essa situação, em que elas se veem obrigadas a assumir essas responsabilidade em casa mesmo mantendo atividades profissionais.

O Governo Lula tomou duas medidas recentes que visam políticas públicas nessa área. A primeira foi a criação da Secretaria Nacional de Cuidados e Família no Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome. A segunda foi a assinatura, em 30 de março, pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva do decreto nº 11.460, que criou o Grupo de Trabalho Interministerial, no âmbito do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome e do Ministério das Mulheres, com a finalidade de elaborar em seis meses, contados a partir da primeira reunião do colegiado, um diagnóstico da organização do trabalho de cuidados no país, seja ele remunerado ou não, e propostas de uma política nacional de cuidados e de um plano nacional de cuidados. Políticas que podem contribuir para desoneração das mulheres no trabalho de cuidados.