O sanitarista Paulo Gadelha, coordenador da Estratégia Fiocruz para a Agenda 2030, ressaltou na abertura do debate promovido pela Iniciativa Saúde Amanhã sobre o Relatório Luz a importância do esforço da sociedade civil de monitorar os indicadores que dão conta de quase duas centenas de metas dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODSs) da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas. Gadelha disse que o Brasil vive um momento crítico em relação à Agenda 2030, com o retrocesso de quase todos os indicadores, e, ao mesmo tempo, promissor por conta das últimas ações do Governo Federal de retomar os esforços para promover o desenvolvimento sustentável, segundo as metas de acabar com a pobreza, proteger o meio ambiente e o clima e garantir que todos os brasileiros possam desfrutar de paz e de prosperidade. Ele lembrou que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou em setembro um decreto reinstituindo a Comissão Nacional para os ODSs, com a coordenação da Secretaria Geral da Presidência da República e a participação de diversos ministérios e órgãos federais, como a Fiocruz, o IBGE e o IPEA (Instituto de Planejamento e Economia Aplicada) que darão apoio técnico aos trabalhos que visam propor estratégias, programas e políticas públicas que contribuam para a implementação dos ODS, além do acompanhamento e monitoramento do alcance das ações sobre o tema. “Ao trabalhar os temas dos ODS, temos um retrato do Brasil”, disse Gadelha, lembrando que a ONU promoverá em 2024 a Cúpula do Futuro para pensar o pós 2030. “A Iniciativa Saúde Amanhã já está pensando em 2050”, disse o sanitarista.
Em seguida, Juliana Cesar, assessora de programas institucionais da organização não-governamental Gestos – Soropositividade, Comunicação e Gênero e integrante do GT Agenda 2030, apresentou o histórico do Relatório Luz, que surgiu da articulação de entidades da sociedade civil que se uniram em 2014 em torno de temas que dizem respeito a construção de um mundo social, econômica e ambientalmente equilibrado. Em 2017, com a criação da Agenda 2030, o grupo que hoje reúne cerca de 60 entidades passou a fazer o monitoramento dos indicadores que dizem respeito aos 17 ODSs. O relatório em debate, que tem como base o ano de 2022, é o sétimo publicado pelo grupo e revelou grandes retrocessos. A importância desse trabalho fica evidente diante do fato de o governo brasileiro ter realizado apenas um dos relatórios anuais exigidos pelo protocolo da Agenda 2030. “No último governo, não foi feito nenhum relatório”, informou Juliana, dizendo que o desinteresse do Governo Bolsonaro não foi apenas em relação ao monitoramento, mas principalmente às políticas públicas, que receberam pouco investimentos e foram em caminhos opostos aos indicados pelos ODSs. Entre os dados apresentador por ela, alguns são espantosos, como o que dá conta de que o índice de representatividade da mulher nos parlamentos federais (Câmara dos Deputados e Senado) do Brasil é inferior ao dos países árabes.
Laura Cury, coordenadora do Projeto Álcool da ACT Promoção da Saúde e cofacilitadora do GT Agenda 2030, falou exclusivamente das 13 metas relacionados ao ODS 3 que trata da necessidade de o desenvolvimento assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todos, em todas as idades. “No Brasil, ainda tendemos a pensar que saúde é o acesso a tratamentos a medicação a profissionais de saúde que é fundamental, mas precisamos pensar na saúde de forma mais ampla, que a defina não só como ausência dela, mas também como o bem estar físico mental e social”, Laura disse, lembrando que no ODS 3 se repete o quadro geral, em que 80% das metas estão em retrocesso, ameaçadas ou estagnadas. A redução do orçamento do Ministério da Saúde desde a aprovação da Emenda Constitucional do Teto de Gastos em 2016 é, segundo ela, um bom retrato das dificuldades de se avançar no ODS 3. Laura destacou a queda dos índices de vacinação contra diversas doenças, caindo de 67% da população para 59% de 2021 para 2022, quando o Ministério da Saúde trabalha com a necessidade de atingir 95% do total. Esse retrocesso, segundo ela, é ainda mais grave se for levado em conta o fato de o Brasil sempre ter sido um caso de sucesso na cobertura vacinal. “O que temos visto infelizmente é um decréscimo ano após ano da cobertura das mais diversas vacinas. Precisamos retomar isso, combatendo a desinformação”, disse.
Após as exposições dos principais dados do Relatório Luz, o coordenador adjunto da iniciativa Saúde Amanhã, José Carvalho de Noronha, abriu o debate com a participação de Ricardo Dantas de Oliveira, coordenador do Projeto de Avaliação do Desempenho do Sistema de Saúde (PROADESS) do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde da Fiocruz, e de Lúcia Souto, assessora especial do Gabinete da Ministra da Saúde. Ricardo Dantas defendeu que se amplie as análises dos indicadores relacionados aos ODSs a partir de outros cenários. Ele deu como exemplo os indicadores sobre doenças crônicas que, se relacionados com o de consumo de alimentos ultraprocessados e de pobreza, que dificulta o acesso a alimentos de melhor qualidade, poderia gerar dados que contribuíssem para a formulação de políticas públicas de saúde nos municípios. Lúcia Souto ressaltou a importância simbólica do lançamento do Relatório Luz 2023 em uma cerimônia no auditório da Presidência da República em 25 de setembro. “É algo muito efetivo lançar esse relatório no núcleo do poder, na Presidência da República em um momento da humanidade de grandes disputas de projetos”, disse Lúcia Souto, ressaltando o empenho do Governo Lula em enfrentar os desafios postos pelos ODSs. O debate pode ser assistido na íntegra no Canal VideoSaúde Distribuidora da Fiocruz.