Os efeitos da poluição e da contaminação por produtos químicos sobre a saúde da população estiveram em pauta, dia 1º de junho, durante o seminário on-line “Mortalidade e doenças por produtos químicos perigosos, contaminação e poluição do ar e água do solo”, promovido pela inciativa Brasil Saúde Amanhã no contexto da Estratégia Fiocruz para Agenda 2030. O debate foi organizado em quatro painéis temáticos, que abordaram a
epidemiologia das doenças crônicas, os riscos da exposição a substâncias químicas para a saúde ambiental, a contaminação do solo e de mananciais e estratégias para prevenção de acidentes industriais ampliados.
Assista ao seminário “Mortalidade e doenças por produtos químicos perigosos, contaminação e poluição do ar e água do solo”
Na abertura do evento, o coordenador executivo da rede Brasil Saúde Amanhã, José Carvalho de Noronha, comemorou os 10 anos da iniciativa, inagurada em 2010 com a publicação do livro “A Saúde no Brasil em 2030: Diretrizes para a Prospecção Estratégica do Sistema de Saúde Brasileiro”, que apresenta ensaios sobre o futuro do sistema de saúde brasileiro. “No último ano, promovemos seminários sobre vacinas e medicamentos, uma oficina sobre o gerenciamento de riscos nacionais e globais de saúde, um seminário sobre abuso de substâncias. Acabamos de concluir uma pesquisa sobre financiamento setorial e estamos finalizando um estudo sobre elementos para subsidiar os critérios de regionalização para o alcance da cobertura universal de saúde. Assim como este seminário, todas as atividades estão relacionadas à Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, especialmente ao Objetivo de Desenvolvimento Sustentável nº 3 (ODS 3), que contempla a saúde”, apresentou Noronha, que é pesquisador do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz).
O moderador do evento, o sanitarista Paulo Gadelha, coordenador da Estratégia Fiocruz para a Agenda 2030 e ex-presidente da Fundação, ressaltou a importância dos esforços de prospecção de futuro. “O portal Saúde Amanhã constitui um acervo muito rico de dados sobre o futuro do sistema de saúde, com grande capacidade para orientar as ações do Brasil na direção dos ODS. Este seminário explora os nexos causais entre poluição, contaminações, desastres e um dos componentes centrais da Agenda 2030: as doenças crônicas não transmissíveis”, apontou Gadelha.
Saúde, ambiente e desenvolvimento sustentável
À frente do primeiro painel, intitulado “Exposição a substâncias químicas: riscos associados e saúde ambiental”, a professora da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Carmen Ildes Rodrigues Fróes-Asmus, afirmou que os riscos de contaminação por substâncias químicas para a saúde humana estão diretamente relacionados ao modelo de desenvolvimento adotado por um país. “O Brasil – e a maioria dos países – privilegia a produção e o lucro, em detrimento da saúde e do ambiente. Para chegar à meta 3.9 do ODS 3 e reduzir substancialmente o número de mortes e doenças por produtos químicos perigosos, é preciso rever esse direcionamento”, defendeu.
Em seguida, durante o painel “Fatores ambientais e epidemiologia das doenças crônicas”, o pesquisador Raphael Mendonça Guimarães, da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz), enfatizou a transição demográfica e epidemiológica da população brasileira e a relação das doenças crônicas com os determinantes sociais da saúde. “No Brasil, o índice de mortalidade por doenças crônicas relacionadas a fatores de risco ambientais e ocupacionais – e não comportamentais – é bastante alto, em torno de 20%. Essa proporção vem se mantendo estável ao longo das últimas décadas, o que denuncia que não houve melhora significativa nas condições de trabalho, que muitas vezes são fontes de contaminação química”, alertou o pesquisador da EPSJV/Fiocruz.
Luís Sérgio Ozório Valentim, diretor de meio ambiente do Centro de Vigilância Sanitária do Estado de São Paulo, apresentou o tema “Contaminação do solo e dos mananciais no Brasil: contextos e perspectivas” e informou que a degradação ambiental está associada à produção de mercadorias, ao seu consumo e descarte na natureza na forma de resíduos. “O aprimoramento dos processos produtivos, a inovação tecnológica e as regulações sanitárias e ambientais, embora tenham cerceado práticas mais agressivas e minimizado a oferta de determinados produtos de alta toxicidade, não foram suficientes para livrar os processos produtivos de seu potencial de poluir o ambiente e causar agravos de toda espécie”, ponderou Valentim.
Por fim, o coordenador do Centro de Estudos e Pesquisas em Emergências e Desastres em Saúde da Fiocruz, Carlos Machado de Freitas, ministrou o painel “Acidentes industriais ampliados: riscos e estratégias de prevenção”. “A gravidade dos acidentes industriais não se restringe à capacidade de um único evento causar um grande número de óbitos. Como vimos em Mariana e Brumadinho, os efeitos desses desastres se estendem no tempo e no espaço. Além das mortes e das doenças provocadas diretamente pela contaminação química, os impactos psicológicos e sociais sobre as populações expostas são intangíveis”, avaliou Machado, que é pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp/Fiocruz). O painelista destacou, ainda, a assimetria de poder entre órgãos locais e nacionais e as instituições diretamente envolvidas nesses eventos, na maioria das vezes, multinacionais. “Para reduzir o impacto de emergências e desastres sobre a saúde pública é preciso desenvolver políticas e ações de prevenção, mitigação, preparação, resposta e reabilitação, com a participação de todo o sistema de saúde e a mais ampla colaboração intersetorial e interinstitucional”, concluiu.